“A invenção, é preciso aceitar humildemente, não consiste em criar do nada, mas a partir do caos. Antes de tudo, os materiais devem estar disponíveis – ela é capaz de dar forma a substâncias obscuras e informes, não de trazer à vida a substância em si. Em tudo o quanto concerne à descoberta e à invenção, mesmo o que pertence à imaginação, somos continuamente lembrados da história do ovo de Colombo. A invenção consiste na capacidade de captar as potencialidades de um assunto e no poder de moldar e organizar as ideias por ele sugeridas” (Mary Shelley, 1831).

O primeiro post deste blog não poderia ser diferente. Faço questão de citar este texto que Mary Shelley escreveu quando foi convidada a escrever um relato sobre a origem do romance Frankenstein ou o Prometeu moderno, que iria compor a edição da Standard Novels. A esta altura o romance já era considerado um bestseller e Mary Shelley uma consagrada e controversa escritora. Saber o que ela pensava acerca da criação, desvendar um pouco de sua poética, de como ela deu materialidade ao seu material de trabalho, tem sido essencial na construção da minha própria poética, ainda que nós duas utilizemos de materialidades bem distintas em nossa criação. Ela, a palavra, eu, o papel.
Segundo Mary Shelley, não se cria a partir do nada, mas a partir do caos. Criar é dar forma a substâncias obscuras, é captar as potencialidades de determinado material. Ou seja, uma ideia não surge simplesmente de um vazio absoluto, mas de um caos de materiais a serem ordenados de modo a servirem ao que será contado. Criar é, portanto, um jogo de conhecer, ordenar e reconfigurar peças disponíveis ao corpo criador.